DocLisboa – Vento Norte

Outubro 24, 2007 at 10:05 am 2 comentários

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Dizia eu no último post que tinha ido ao DocLisboa e tinha recuperado um bocado dessa virgindade, dessa pureza inicial…essa inocência do olhar e para isso só mesmo os meus irmãos do norte da Europa, no caso um Norueguês e um Dinamarquês de ascendência árabe.

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O primeiro é o Even Benestad que pelo que percebi apenas fez duas obras, “all about my father” e “natural born star” a primeira em 2001 e a segunda em 2007. Foi a de 2001 que fui ver e posso dizer que é absolutamente brutal! Tivesse eu estado com atenção em 2002 e tinha visto este mesmo documentário na edição desse ano do Festival Gay e Lésbico que como sempre está na linha da frente do melhor que se vai fazendo na sétima arte!

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Este Even é filho de um médico Esben Benestad que vive numa pequena cidade e tem consultório montado…até aqui…tudo bem!…tem também editados vários livros de educação sexual e escreve artigos para revistas….até aqui….tudo bem!….ao que parece é politico Liberal e apesar disso ser uma coisa degradante não sobre isso que o filho faz este documentário, o que ele é também e que o filho decide documentar é ……. Travesti!Pois é isso mesmo uma traveca, Esther Pirelli, do melhor que já se viu, cheio de si mesmo e duma conversa de diversidade e orgulho gay que pratica mesmo, com uma mulher que vai naquilo e sai á rua descontraidamente com o seu marido vestido de mulher e vão ás compras juntos a lojas de mulher e a jantares e eventos sociais….enfim uma coisa mesmo atípica, valentemente corajosa e até admirável naquela prespectiva do mundo diverso e da liberdade de escolha…..o único problema é talvez o filho e a filha que vendo aquele comportamento já de si chocante (para eles, claro) ainda por cima a ser espalhado ao sete ventos com atitudes espalhafatosas de soberba gay, ficam assim tipo….”meu! qual gaja qual quê!….estamos a falar do meu…..PAI!”.

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Tudo isto é focado num brilhante documentário, que pretende ser uma visão da realidade do pai mas do ponto de vista do filho. Consegue muitíssimo bem, cheio de ternura, duma proximidade ao Esben e ao mesmo tempo duma inflexibilidade e dum distanciamento e até repulsa a Esther (personalidade traveca de Esben). O realizador usa a Irmã e a Mãe (divorciada do pai por causa deste tema) para mostrar e lembrar o pai que teve e que era uma espécie de super-pai que velejava, fazia desporto era reconhecido na sociedade como profissional e como elemento mainstream de grande valor para uma pequena cidade….a irmã fala dele duma forma carinhosa e saudosista e mantém a sua relação inalterada com o pai, tentando cooperar com a sua preferência, a sua escolha e chega a ir a encontros de travestis com o pai a Oslo….é simplesmente fantástico, uma capacidade brutal de ajuste e de encaixe. Usa também a madrasta que é uma mulher inteligentíssima e novamente a irmã para levantar o véu sobre o futuro deste homem que receiam as duas se venha a transformar progressivamente numa mulher, deixando morrer a sua faceta masculina e esse momento é dos melhores do filme em que fica exposto claramente a preferência de todos os que Esben ama pelo seu lado masculino e que imediatamente nos transporta para o egoísmo, para o egocentrismo e para o alienamento que este homem vive! Muito para lá da conversa da diversidade que faz sentido em certo espectro, mas que quando se chega à intimidade de uma vida familiar e a perguntas como esta, deixa de fazer sentido pois que se está a falar da pessoa em concreto, da vida dos que com ele vivem e vão viver até ao fim, dos que o amam de verdade!!

O problema maior, no presente, parece vir de onde menos o pai espera, do filho, que apesar de não alardear a sua incompreensão e o seu inconformismo ficou, no processo de divorcio e na posterior fase de comportamento afirmativo do pai, do seu ” sair do armário”, ficou dizia eu, entrincheirado numa espécie de silêncio neutro que o pai parece achar ser uma forma de adaptação mas que se vai vendo ao longo do documentário que é mais um grito mudo de ….” isso é tudo muito giro se não estivéssemos a falar do meu PAI!!!”.

Ainda dá para ir ver na próxima sexta dia 26, ás 16.15h no pequeno auditório é uma coisa que se não deve perder de forma alguma, super actual e um monumento à diversidade por um lado, mas também ao pormenor gigantesco de que as escolhas individuais podem ter consequências graves naqueles que supostamente deveriam ser a força motriz das nossas escolhas individuais.

Sobre o segundo filme falo no próximo post.

até jazz

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Se não me trai a memória! – o cinelagoa DocLisboa – Vento Norte 2

2 comentários Add your own

  • 1. aquasensia  |  Outubro 24, 2007 às 3:06 pm

    Bem, dizer-lhe que já tinha saudades suas, do seu humor e das suas reflexões bem prá-frente de todos nós, já começa a ser banal. Dizer-lhe que estou cheiinha de dor de cotovelo por não estar, este ano, por motivos de força maior, maior do que tudo, a absorver tudo o que nos oferece, este ano, também o DocLisboa, é pouco. Não é só dor de cotovelo, não é só o não poder olhar com os olhos virgens, é também validar a descoberta, à bué, que as experiências dos outros (filmadas, escritas, pintadas, ou, ou…) me fazem falta pelo que acrescentam ao muito pouco que eu acho que cada vez mais sei. Mas dizer-lhe que é uma enorme satisfação saber que está de volta e em grande força,
    e que me faz desejar continuar a ser blogista apenas pelo prazer que é encontrar colegas blogistas como o Pedro, ufa, é uma lufada de ar fresco. Bem haja.

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  • 2. pedromoraiscardoso  |  Outubro 24, 2007 às 4:12 pm

    Mariaaaaa….que bom lê-la de novo, ainda onde tive no seu blogue horas a fio. Vejo que continua gentil comigo apesar dos disparates que insisto em escrever!

    Obrigado e bem haja

    Responder

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